O Ministério da Cultura (MinC) estabeleceu neste mês de dezembro um grupo de trabalho para apurar informações e planejar a nova Política Nacional para as Culturas Tradicionais e Populares, programa para fortalecer as manifestações culturais que compõem a identidade brasileira.

O anúncio foi feito na tarde de sexta-feira, 06, pela coordenadora do Escritório Estadual do MinC, Loa Campos, durante o seminário “Arte e Agroecologia: políticas culturais para os povos do campo, águas e florestas”, evento dentro da programação da 21ª Jornada de Agroecologia. A atividade foi promovida pelo Comitê de Cultura do Paraná.

No próximo ano, uma série de encontros e debates também deve ajudar a desenhar a nova Política Nacional. “Teremos um processo de muito diálogo antes de fechar este plano”, disse Loa Campos. Ela também destacou a vitória histórica da classe artística com a Lei Aldir Blanc, que garante o maior montante de recursos já vistos no país para financiar projetos culturais pelos próximos cinco anos.

A Jornada de Agroecologia, um dos maiores encontros brasileiros sobre temas como agricultura familiar, meio ambiente e alimentação saudável, acontece de 4 a 8 de dezembro, no campus Politécnico da UFPR.

No seminário promovido pelo Comitê estiveram presentes ainda Lucia Martins Pereira, a Lucinha, artista e assentada da reforma agrária de Minas Gerais, o professor da Universidade Federal de Ouro Preto Maurício Leonard de Souza e o rapper paulista Rincón Sapiência.

Em uma breve fala, o coordenador do Comitê de Cultura, João Paulo Mehl, lembrou que, embora à primeira vista não pareça, cultura e agroecologia são conceitos intrinsecamente ligados.

“Como a gente vai falar de cultura sem falar dos territórios, dos saberes ancestrais, do que a gente aprendeu com os que vieram antes?”, perguntou. “É fundamental a relação da arte e da cultura com a terra.”

“Ao Comitê não cabe levar cultura pra lugar nenhum, porque a cultura já existe nos territórios. O que cabe ao Comitê é fortalecer o que já acontece, fazer a política pública chegar lá.”

Em sua intervenção, Lucinha foi na mesma direção. “Pra mim, a agroecologia é poder ver, enxergar, sentir e ouvir a diversidade do mundo numa horta”, explicou. “E isso a gente só consegue através da arte, que faz a gente entender o que é bonito, o que é belo, sentir a mesma coisa que sentiam nossos antepassados.”

Tudo muito diferente do que acontece em lavouras de monocultura, segundo ela. “Uma plantação de eucaliptos enfileirados parece um grupo de soldados do mal, todas as árvores com a mesma postura, do mesmo jeito, como se estivessem numa marcha pra destruir a natureza.”

O professor Maurício Leonard expôs experiências com projetos de extensão feitos pela Universidade de Ouro Preto. Entre elas, o Festival da Terra, que o docente definiu como uma “tecnologia da política do festejo”, numa estratégia de aproximação com os pequenos produtores rurais.

“O que a gente quer no final das contas é afirmar a identidade cultural da região. Pra fazer agroecologia, a gente precisa se fundamentar na cultura. É a partir dessas marcas culturais que se vai produzir comida. Fazer agricultura, não agronegócio.”

O rapper Rincón Sapiência, que também é um militante da alimentação saudável, demonstrou preocupação com os cardápios consumidos pelas famílias nas periferias das grandes cidades.

“Eu venho de uma família preta que tem um histórico de problemas de saúde totalmente ligados à alimentação. A alimentação deve ser uma pauta quando a gente fala da resistência das periferias.”

Para ele, isso acontece por dois motivos: falta de informação e o preço mais caro dos alimentos saudáveis se comparados, por exemplo, aos ultraprocessados. “Existe um recorte elitista nesse caso, e isso precisa mudar.”

“Eu sei que existe muita curiosidade nas pessoas. Eu ainda moro na periferia, e quando posto nas redes um vídeo sobre esse assunto, as pessoas falam comigo na rua. Mas ainda falta as pessoas entenderem o que são os orgânicos, e que isso faz bem pra vida delas.”

Crédito da foto: Dane Freitas.